sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

Debate ontem no Campo Pequeno: as touradas só são longas quando são chatas...

O dabate de ontem no Campo Pequeno foi moderado por José Cáceres e teve
a interessante participação de Patrícia Sardinha, Pedro Reinhardt, Rui Bento
e Rui Salvador
Esteve cheio o Salão Nobre do Campo Pequeno
A administradora do Campo Pequeno, Drª Paula Resende,
foi ontem uma espectadora atenta do debate sobre a
longa duração das corridas de toiros
O director de corrida Rogério Jóia olhando para o
relógio - uma imagem bem significativa do tema que
ontem foi discutido no Campo Pequeno. Em baixo,
um WC da praça de toiros de Lisboa. Onde era preciso
ter muitos mais... mas disso ninguém falou...


As touradas duram em norma três horas e picos e há quem considere isso uma eternidade. Três horas durou há dois anos no Pavilhão Atlântico o concerto do Elton John e se ele tem cantado mais três horas ninguém dali sairia. O problema, ontem discutido num Colóquio no Campo Pequeno, não é a longa duração das touradas. É, antes, o facto de muitas delas serem uma chatice tão grande que até dão sono ao Engº Jorge de Carvalho - e a todos. Diminua-se o número (excessivo) de corridas por ano, apresentem-se elencos aliciantes e que não sejam “mais do mesmo”, os toureiros que se disciplinem e tenham a hombridade de só dar a volta à arena quando a merecerem mesmo - e o problema está resolvido. Três horas é muito tempo num espectáculo chato, Mas num bom espectáculo até sabem a pouco. Ontem disse-me muita coisa, foi quase como discutir-se o sexo dos anjos - e pouco se resolveu. Ficou tudo como estava. As alterações propostas diminuiriam, quando muito, o tempo em dez ou quinze minutos. Não é nada.

Miguel Alvarenga - As corridas de toiros são longas - isso todos sabemos. Há forma de lhes reduzir o tempo? E há mesmo necessidade de o fazer ou o público, o santo público, habituado como está, pouco se importa que elas durem três horas ou que lhes reduzam, subtraindo alguns tempos mortos, dez ou quinze minutos? Isso fará grande diferença? O principal problema, na minha opinião, não tem a ver com a longa duração das corridas, mas antes com a “chatice” que muitas delas são. Há corridas em que ao fim de uma hora, como ele próprio ironizou, o Engº Jorge de Carvalho já dorme… e há corridas que duram uma eternidade, mas são tão boas que se durassem outras três horas não maçavam ninguém. Como Patrícia Sardinha ontem muito bem disse, as corridas não são longas, às vezes são é chatas. Que é muito diferente.
Este tema foi base de um interessante Colóquio realizado ontem no Salão Nobre da praça de toiros do Campo Pequeno, que foi pequeno para tanta gente e que atraíu aficionados, forcados, ganadeiros e toureiros e que foi mais uma louvável jornada organizada pela empresa da praça, pelo canal Campo Pequeno TV e pelo Grupo Tauromáquico “Sector 1”.
Aplauda-se o minucioso estudo (brilhante a todos os títulos!) feito por José Cáceres - quase paciência de chinês -, que nos deu ao pormenor e praticamente ao segundo todos os tempos em que decorrem os muitos momentos que compõem uma corrida de toiros, estudo esse baseado na análise detalhada das corridas que no ano passado se efectuaram em Lisboa.
Ficámos a saber, por exemplo, que as corridas à portuguesa, em média, duram 3h08m, as mistas, duram em média 2h53 e que durante 42% do tempo o toiro não está em praça. Ou seja, nesse tempo ocorrem as cortesias, os toques, as recolhas de toiros, as voltas à arena, as limpezas da arena, etc.
Foi muito falado e também muito criticado o novo Regulamento do Espectáculo Tauromáquico (RET), nomeadamente no que respeita aos tempos de lides e de pegas, mas sobretudo na forma como são concedidas (pelo director de corrida) as voltas à arena. Mas eu pergunto: quem fez o Regulamento? Foram os homens do futebol ou foram os homens dos toiros?… É que, às tantas, parecia entender-se que este Regulamento tinha sido feito por gente que nada tem a ver com o mundo dos toiros, daí as falhas e os erros que muitos lhe apontaram…
Espremendo as opiniões e as intervenções dos participantes no Colóquio - o director de Tauromaquia do Campo Pequeno, Rui Bento; o cavaleiro Rui Salvador; o director de corrida Pedro Reinhardt (presidente da Associação de Directores de Corrida); e a presidente do Grupo Tauromáquico “Sector 1”, Patrícia Sardinha - chegámos à conclusão de que todos concordam que três horas é muito tempo para uma tourada, mas que também há pouco ou quase nada a fazer para lhe diminuir a duração.
Alvitrou-se um “ritmo mais acelerado” nas cortesias, a empresa anunciou que suprime o intervalo (como experiência, nas primeiras corridas, podendo voltar a fazê-lo se a coisa não der certo) e que as corridas passam a iniciar-se às 21h45 em vez de ser às 22 horas, porque, disse Rui Bento, muita gente que vem de fora queixa-se que depois chega a casa às cinco da manhã. Assim, passará a chegar às cinco menos um quarto, que praticamente é o mesmo…
Até aqui, nada de significativo que altere o tempo da corrida. Falou-se também na hipótese de se passarem a lidar quatro toiros em vez de seis, como já aconteceu em situações pontuais (por exemplo, a corrida de Morante com o cantor Cigala, há dois anos). Não sei se o público aceitaria. E isso obrigaria a reduzir drasticamente o preço dos bilhetes, tiraria glamour à corrida de toiros.
O problema, insisto, não está na longa duração de uma corrida. Está muito mais na chatice que muitas vezes se torna uma corrida. Há corridas em que ao fim de uma hora já todos temos sono. E corridas que se durassem outras três horas mais, ninguém se importaria de ali ficar a vê-las, antes pelo contrário.
Iniciar no Campo Pequeno as corridas um quarto de hora antes, não sei se vai alterar alguma coisa. O povo português não é disciplinado, vai continuar a chegar ao seu lugar um pouco depois das dez da noite.
Suprimir o intervalo, a meu ver, não vai dar resultado. As pessoas passam a poder ir ao bar e ao WC nos oito minutos que decorrem entre o fim de uma lide e o início da próxima. Vai ser um vai-vem nas bancadas, que o melhor é colocar polícias pelo meio a controlar e a disciplinar o “trânsito”.
E depois, há um problema que ninguém frisou ontem: o Campo Pequeno tem pouquíssimas casas de banho, praticamente uma (e escassa) para cada três sectores. Foi um erro crasso de quem planeou as obras. Mesmo no intervalo, formam-se filas intermináveis pela escada acima para podermos ir satisfazer as nossas necessidades. Quem está aflito e sai ao intervalo para ir ao WC, normalmente (aconteceu-me algumas vezes) já não chega a tempo de entrar na bancada para ver a próxima lide. Necessidade urgente: mais casas de banho na praça!
Com mais ou menos um quarto de hora, com ou sem intervalo, não será isso que vai contribuir para reduzir o tempo de uma tourada. Já no que respeita às voltas à arena, isso sim. Foi ontem forcado por vários intervenientes, e concordo plenamente, que os toureiros têm que se disciplinar e que ter a hombridade de só dar a volta se, de facto, tiverem protagonizado uma grande actuação. Muitas vezes nem tem a ver com eles, mas com as qualidades dos toiros que enfrentam. Mas a verdade é que as voltas à arena deveriam ser dadas apenas quando plenamente merecidas e não apenas “por dá cá aquela palha”. Isso, sim, poderia contribuir para a diminuição do tempo das touradas. Mas também não seria demasiado significante.
João Palha Ribeiro Telles, com a frontalidade e petinência que lhe reconhecemos, alvitrou várias soluções para diminuir o tempo das touradas, arricando mesmo aconselhar que os toiros deixem de ser recolhidos por campinos e cabrestos, já que, disse, "é muito mais rápido o toiro ir para dentro com os bandarilheiros". E apelou a que, depois da reunião de ontem, "se unam as tropas", ou seja, toureiros, forcados e demais intervenientes, para que cheguem a consensos para tornar menos aborrecedora a duração das corridas. O ganadeiro Engº Jorge de Carvalho também pôr o dedo na ferida e lembrou "as voltas à praça que os cavaleiros hoje em dia dão a cavalo", antes de sairem da arena, o que deverir levar depois o director de corrida a não autorizar a volta a pé, "uma vez que já a deram".
Resumindo e concluindo, o Colóquio de ontem no Campo Pequeno foi uma interessante e agradável jornada, mais uma, promovida sobretudo pela empresa, para animar este tempo de quase pós-defeso. Mas, feitas as contas, depois das que José Cáceres - que foi também um brilhante moderador do debate - tão bem fez, chega-se à conclusão de que há muito pouco ou quase nada a fazer para diminuir o tempo de duração de uma corrida de toiros - que, quando é boa, poderia até durar seis ou sete horas, que não maçava ninguém. E quando é chata - esse é e será sempre o verdadeiro cerne da questão - dá sono não apenas ao Engº Jorge de Carvalho, como à santa paciência de todos nós…

Fotos Maria Mil-Homens